Hoje ouvi do
meu apartamento uma briga de casal. O relacionamento, pelo que pude perceber,
acabara por uma traição da parte dela. Eles brigavam a plenos pulmões na frente
do prédio, indiferentes a todos os moradores que os ouviam proferir ofensas e
confessar intimidades.
O rapaz a
acusava de tê-lo trocado por um cara rico e ela nem se dava ao trabalho de revidar.
Na minha escuta, primeiro tomei partido do rapaz. Ele parecia muito magoado. No
entanto, no auge da discussão ele começou a chamá-la de puta. Achei aquilo
muito forte! E ela apenas ouvia, balbuciava uma ou duas palavras e se calava,
enquanto ele gritava para a rua inteira o quanto a achava vagabunda. Senti
vontade de gritar: “moça, diga alguma coisa! Não deixe esse cara te tratar
assim!”, mas não gritei nada e ela aguentou as ofensas até o fim.
Fiquei me
perguntando o porquê daquela moça ter se apaixonado por um cara que acabaria gritando coisas
horríveis sobre ela para quem quisesse ouvir. Teria sido ele, no início de
tudo, um gentleman? Duvido muito... Teria ao menos, ao longo do relacionamento,
dado a ela uma flor? Teria ele usado a estranha e eficiente linguagem dos
namorados de Drummond?
Imaginei
quantas coisas bonitas eles deviam ter vivido juntos e que agora, naquele
momento de raiva, nada significavam. Estava tudo esquecido e acabado. Cada um
queria apenas sair fazendo o maior estardalhaço possível, batendo a porta e
deixando pra trás muita bagunça e sofrimento. Se um dia eles se encontrarem na
rua, muito tempo depois das ofensas gritadas na frente do meu prédio, será que
irão sorrir um pro outro, se abraçar e perguntar “oi, tudo bem? Quanto
tempo!"? Ou vão apenas fingir que não se viram ou não se reconheceram? Cartola
disse que de cada amor a gente herda só o cinismo. Aquele casal desconhecido
brigando me fez perceber que essa frase tem muito de verdade.
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