domingo, 1 de maio de 2011

O Bêbado e a Equilibrista

Ainda existe esperança. Hoje acordei com os meus vizinhos ouvindo Elis Regina, e fiquei feliz em saber que ainda há quem ouça música de qualidade nesse país. 
Esse episódio, no entanto, me trouxe a vontade de escrever sobre essa música da Elis, "O Bêbado e a Equilibrista".
A música trata do período da Ditadura Militar brasileira, e é de composição do João Bosco e do Aldir Blanc. Já  vi muita gente cantar e ouvir essa música sem saber na verdade o que ela significa; por isso segue a letra comentada:


O Bêbado e a Equilibrista

Caía a tarde feito um viaduto
“Caía a tarde” faz referência ao horário que começavam as torturas no DOI-CODI, geralmente ao cair da tarde. “Feito um viaduto” se refere à queda de parte do Viaduto Paulo Frontin, obra do governo, no Rio de Janeiro, que caiu em 1971 e deixou 48 mortos. 

E um bêbado trajando luto
Me lembrou Carlitos...
Esses versos se referem ao personagem de Charles Chaplin, Carlitos, um andarilho que apesar de pobre, age como um cavalheiro.

A lua
Tal qual a dona do bordel
Pedia a cada estrela fria
Um brilho de aluguel
Bom, a interpretação desses versos é meio contraditória. Uns dizem que “A lua” é uma referência à Rede Globo, que cresceu às custas da ditadura. Outros, porém, dizem que se refere aos políticos que ficaram ao lado do regime militar em troca de benefícios pessoais.

E nuvens!
Lá no mata-borrão do céu
Chupavam manchas torturadas
Que sufoco!
Louco!
O bêbado com chapéu-coco
Fazia irreverências mil
Pra noite do Brasil
As “nuvens” fazem referência aos torturadores, que “chupavam manchas torturadas”, no caso, maltratavam, torturavam os presos políticos. Enquanto que “o bêbado com chapéu-coco” representa os artistas que “faziam irreverências mil” ou protestos, contra a ditadura, ou a “noite do Brasil”.

Meu Brasil!...
Que sonha com a volta
Do irmão do Henfil.
Com tanta gente que partiu
Num rabo de foguete
O “irmão do Henfil” é Betinho, um sociólogo e ativista dos direitos humanos que ficou exilado por oito anos. Henfil, irmão de Betinho, escrevia na última página da  revista “Isto É”, cartas para a mãe dele; que falavam nas entrelinhas da vida política do país e da vontade de que seu irmão exilado retornasse ao Brasil.
Ele escreve em seu livro Cartas da mãe: “Aos poucos fui escrevendo o nome Geisel. Até ele se acostumar e não achar que era desrespeito. Depois fui tomando liberdade de sentar no colo dele, mexer nos bolsos dele. Quando ele viu, eu tinha pregado chicletes na cadeira dele. Aí, já era tarde. Aldir Blanc e João Bosco já cantavam pela voz de Elis: - Meu Brasil que sonha com a volta do irmão do Henfil...”

Chora!
A nossa Pátria
Mãe gentil
Choram Marias
E Clarisses
No solo do Brasil...
“Choram Marias e Clarisses” é uma referência clara às esposas de Manuel Fiel Filho, e de Vladimir Herzog, o Vlado. Ambos foram presos políticos, que morreram na prisão; Manoel por torturas, e Vlado através de um suicídio mal forjado que revoltou o país.
Juntas, “Marias e Clarisses” são todas as esposas e mães brasileiras que viram seus filhos e maridos serem presos e torturados.

Mas sei, que uma dor
Assim pungente
Não há de ser inutilmente
A esperança...
Dança na corda bamba
De sombrinha
E em cada passo
Dessa linha
Pode se machucar...
Azar!
A esperança equilibrista
Sabe que o show
De todo artista
Tem que continuar...
Esses últimos versos se referem à resistência feita pelos artistas, que tinham como arma única a arte. Tanto eles quanto a sociedade em geral viviam na corda bamba, podendo se machucar a qualquer momento, por pisar fora da linha estipulada pelos militares; porém, apesar de tudo, todos têm consciência de que o show tem que continuar.


- Segue um vídeo sobre a volta dos exilados políticos, retirado da minissérie Queridos Amigos; a música acima tratada é fundo musical deste: 

2 comentários:

  1. Gostei muito érica, parahttp://essenciaego.blogspot.com/benss
    te seguindoo viu

    bjoss


    http://essenciaego.blogspot.com/

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  2. Muito Bom seus comentários sobre esta música Érica!
    Humberto

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