segunda-feira, 11 de agosto de 2014

O Bilhete

"Todos os homens voltam para casa. Estão menos livres, mas levam jornais e soletram o mundo, sabendo que o perdem". A moça sozinha, sentada na mesa do canto do restaurante, fez-me lembrar estes versos do poema de Drummond. Em sua visível solidão, ela parece perder absolutamente tudo o que se passa ao seu redor, enquanto mexe desanimada em seu prato de comida italiana. Perco completamente o fio da conversa animada que se passa entre os meus amigos, tão concentrado que estou na moça de expressão triste sentada na mesa do canto.
De minuto em minuto ela larga a sua contemplação da rua, através da janela de vidro, e olha o celular. Não consigo ver o que faz nele, de onde estou sentado, mas imagino que deva estar conferindo as mensagens ou algo do tipo. Ela parece bem ansiosa em sua espera. Imagino se o que faz a moça tão solitária e desanimada é algum caso de amor... Reconheço na sua expressão um pouco de mim, em um recente momento de dor em que perdi um grande amor.
Mal completo o pensamento e ela pega o celular mais uma vez e sorri pra ele, começando a digitar frenteticamente. Imagino que quem fazia a moça tão triste antes, finalmente apareceu. Mas sua alegria parece durar apenas alguns poucos minutos. Depois de digitar freneticamente por um tempo, ela larga o celular na mesa e fixa o olhar, pela janela, na avenida movimentada fora do restaurante. Finjo que vou jogar um copo descartável no lixo apenas para chegar mais perto dela e ver melhor o seu rosto. Não sei o que me causou tanto interesse nela, talvez a sua solidão violenta. Ao me aproximar, percebo que duas lágrimas escorrem em seu rosto.
Resolvo de supetão tomar uma atitude e falo com ela.
"- Moça, boa tarde, posso me sentar aqui?"
Ela apenas limpa os olhos com as costas da mão e me olha surpresa. Sento-me sem permissão, mas ela levanta e me diz, com muita tristeza na voz:
"- Sinto muito, estava esperando alguém que não vai aparecer. Boa tarde..."
E com isso vai embora, deixando-me completamente sem ação. Fico me perguntando porque falei com ela, porque maculei o seu momento tão íntimo de solidão, aparentemente muito necessária. Meu olhar então é atraído por um papelzinho amarelo amassado ao lado do prato, com uma refeição quase completa. Percebo que é um barquinho de papel que foi amassado. Abro sem pensar e vejo que nele há um bilhete escrito em uma letra miúda e bem desenhada.
"Meu bem, muito beijo pra você por ter me tirado da monotonia dos fins de semana. Quase não acredito que vamos nos ver em pleno domingo... Eu não sei se você vai acreditar no que vou dizer, mas acho que te amo."

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